5.09.2007

DES-pedir I

Despedir-se de algo que não faz mais sentido e abrir-se para os desafios e as oportunidades de um novo ciclo é parte natural da vida. Então por que será que é tão difícil dizer adeus?

(...) Existem momentos assim na vida, de corte, de conclusão. A perda pode vir por uma circunstância externa, como no caso da morte de alguém querido, uma demissão, uma separação repentina, um acidente. Mas pode também ser decorrente de um processo em que a decisão final depende de nós. De qualquer forma, nos dois casos, temos de nos despedir. E esse processo dói.
Deixar ir embora faz parte da existência, tanto quanto começar um ciclo novo. Só que, em diferentes graus, todo ser humano tem dificuldade de colocar um ponto final.
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O que é o adeus?
Em primeiro lugar, tiremos a carga negativa que gira em torno da despedida. Por si só, adeus não quer dizer desistência, abandono ou fracasso: essas são interpretações atribuídas por nós mesmos. O psicólogo Wagner Canalonga, sacerdote da Sociedade Taoísta de São Paulo, recorre a uma imagem bonita para representar o adeus: é como atravessar uma porta, deixando um ambiente para entrar em outro. A mesma porta que se fecha atrás de você, impossibilitando seu retorno para o primeiro cômodo, permite sua entrada no novo aposento. Em outras palavras, o fim é sempre o começo de uma outra história. Ter isso claro traz uma compreensão diferente e mais leve do que está por vir.

Outra metáfora bastante oportuna: você já ouviu falar de ecdise? Trata-se da mudança periódica de casca dos artrópodes. O esqueleto externo, rígido, limita o crescimento do bichinho. Por isso, de tempos em tempos, é preciso que ele deixe a casca velha para formar uma nova e mais folgada e continuar a se desenvolver. Assim também é conosco: as diversas experiências vividas dia a dia vão nos “alargando” interiormente. Até o instante em que as escolhas antigas tornam-se obsoletas e novas se fazem necessárias – mesmo que seja para continuar na trajetória anterior (no casamento, na carreira, naquele modo de viver), mas com outra presença e outros paradigmas.
E como identificar esse instante de revelação? “É um forte chamado interior, como se uma parte bastante profunda de você – a alma e não o ego – o conduzisse para um rumo um tanto indefinido. Mas, aos poucos, aquele caminho vai fazendo sentido”, afirma a psicóloga junguiana Regina Nanô, de São Paulo. “Hoje a razão virou o único ponto de apoio para as pessoas. Mas a intuição é que nos guia, por isso devemos levar em conta o que diz nosso coração.” Uma amiga tem um reflexão muito bonita a respeito. Ela costuma falar que “o ego grita, a alma sussurra”. Como vivemos num mundo ruidoso, tomado por mandamentos vindos de todos os lados (da cultura, da moda, da publicidade), só escutamos os berros – os do ego, querendo manter o controle a todo custo, e os dos outros. Os apelos da alma, aqueles que injetam vitalidade na existência, ficam inaudíveis.

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